05 DE DEZEMBRO DE 2024
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RENATA DAL-BÓ

27/11/2024 06:00

A sociedade do cansaço

Nesta segunda-feira, ao sentar para escrever a crônica da semana, confesso que considerei republicar um texto antigo. O fim do ano se aproxima e o cansaço bate mais forte: cansaço da rotina, do pensar, do escrever. Inspiração, onde anda você? 

Mesmo em um ano de tantas conquistas pessoais e profissionais, me pergunto por que não consigo relaxar, me orgulhar do que realizei e desacelerar. A sociedade nos empurra a buscar mais, sempre mais. Como canta Legião Urbana, “o que é demais nunca é o bastante”.

Outro dia, ouvi pela primeira vez alguém do meu meio mencionar que sofria da “síndrome de burnout”. A pessoa me explicou que sentia um esgotamento profundo, um cansaço físico e mental excessivo, dor de cabeça frequente, insônia e dificuldade de concentração. Infelizmente, sintomas tão conhecidos por todos nós. 

O filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, em seu livro “A Sociedade do Cansaço”, descreve nossa exaustão como o resultado de uma sociedade que transformou a vida em uma eterna competição consigo mesmo. Segundo o autor, somos marcados por uma pressão constante e nos sentimos obrigados a estarmos sempre ativos, em uma busca desenfreada pelo sucesso. Por isso, doenças como depressão, burnout, TDAH e ansiedade estão cada vez mais prevalentes. O anseio incessante pelo “fazer mais” nos assemelha às máquinas, negligenciando necessidades humanas essenciais, como o ócio, a contemplação e a convivência.

Ah, o tão almejado ócio! Lembram? Aquele espaço para criação e reflexão, hoje quase um pecado capital.  O poetinha Vinícius de Moraes é que sabia viver. Com seu whisky na banheira, sabia do valor do ócio criativo. Para ele, a pausa era mais do que necessária; era essencial para a poesia, para a vida. Ah, quem dera a gente pudesse retomar essa leveza, essa permissão para não fazer nada — e ainda assim se sentir pleno.

Nessa busca desenfreada, frequentemente não sabemos exatamente o que estamos procurando, mas sentimos que não podemos parar. É como se a necessidade de fazer, postar e aparecer fosse essencial para definir quem somos — ou quem desejamos ser. A ansiedade e angústia de ficar para trás nos consome, e acabamos presos em um ciclo exaustivo de produção e validação.

Em um mundo que glorifica a produtividade e a hiperatividade, permitir-se pausar e recarregar as energias é quase um ato subversivo. Talvez seja exatamente isso o que falta em nossa sociedade do cansaço: a coragem de dizer basta. E perceber que o que já somos, e o que já fizemos, pode ser mais do que suficiente. 

Se Vinícius conseguia criar belíssimos poemas e letras de músicas na banheira, por que não podemos criar no silêncio de uma pausa? E quem sabe neste respiro a inspiração volte a dar o ar da graça.

Diário do Sul
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