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RENATA DAL-BÓ

17/12/2025 06:00

A difícil arte da comunicação

Comunicar-se, hoje, é quase um exercício de adivinhação. A pessoa fala uma coisa, a outra entende outra completamente diferente, e ambas saem da conversa com a firme convicção de que têm razão. No meio do caminho, perde-se o diálogo, a intenção e, muitas vezes, o relacionamento.

Nos manuais de comunicação — esses que aprendemos no jornalismo — tudo parece muito organizado: emissor, mensagem, receptor, canal e ruído. Funciona bem no papel. Na vida real, o ruído costuma chegar antes da mensagem. Ele vem travestido de experiências passadas, frustrações acumuladas, silêncios engolidos e feridas que nunca cicatrizaram direito.

Alguém diz “estou preocupado” e o outro escuta “estou te cobrando”. Diz “preciso ficar um pouco sozinho” e o receptor traduz como abandono. Não é má vontade. É filtro emocional. Cada pessoa escuta a partir do que viveu — e não do que o outro quis dizer.

Muito do que se discute hoje nos relacionamentos não é exatamente sobre o conteúdo da fala, mas sobre o sentido que ela ganha ao atravessar histórias pessoais. A intenção sai de um jeito; a interpretação chega de outro. E entre uma coisa e outra, instala-se o conflito.

Nos ensinamentos que circulam por aí — e que muitos de nós ouvimos em reflexões filosóficas sobre ética, convivência e responsabilidade — fica claro que diálogo não é apenas falar bem. É escutar com atenção, suspender certezas, admitir que o outro pode não estar nos atacando, apenas tentando se expressar do jeito que consegue.

O problema é que escutar dá trabalho. Exige tempo, humildade e disposição para rever certezas. É muito mais fácil reagir do que compreender. É mais rápido responder do que perguntar. Mais confortável acusar do que tentar traduzir.

Talvez o grande desafio contemporâneo seja esse: aprender a negociar sentidos. Trocar o “foi isso que eu quis dizer” por “como você entendeu?”. Aceitar que duas pessoas podem sair da mesma conversa com leituras completamente diferentes — e que isso não faz de nenhuma delas vilã.

Relacionamentos não se rompem por falta de palavras, mas por excesso de interpretações. E talvez comunicar seja isso: um exercício diário de paciência, escuta e gentileza. Um esforço constante para diminuir o ruído e aumentar o encontro. Mesmo sabendo que não existe manual. E que, quase sempre, a gente aprende errando.

Diário do Sul
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