Joel Borges Corrêa participou das manifestações de 8 de janeiro de 2023 e foi preso na Argentina em novembro
Um sentimento de injustiça contra si e de arrependimento por ter participado das manifestações de 8 de janeiro de 2023, em Brasília, mas não por defender as ideias que acredita. Após dois anos do ocorrido, essa é a posição do tubaronense Joel Borges Corrêa, que está preso na Argentina desde novembro. A entrevista foi concedida ao portal Sul Agora.
“Eu não me arrependo de ter meu pensamento pelas coisas que eu acredito. Sou a favor da família e da liberdade. Mas digo uma coisa: eu nunca mais vou a manifestação nenhuma. Eu me arrependo de ter ido nessa manifestação, que acabou com a minha vida. E me sinto injustiçado por não ter tido a oportunidade de poder falar e me expressar. Se teve um erro que cometi, foi o de ter entrado no ônibus e ter parado nesse lugar, parece uma cena de filme de horror”, disse.
Joel falou com a esposa, Míriam Cristina Alves Corrêa, por telefone, pouco antes dela conversar com a reportagem do Sul Agora, na segunda-feira (27). Ele foi transferido para o Complexo Penitenciário Federal de Ezeiza, próximo de Buenos Aires, na sexta-feira (24), onde há outros quatro brasileiros presos. De lá, ele pôde se comunicar com a mulher por telefone.
Ele estava morando em Buenos Aires quando foi detido em 19 de novembro, em uma blitz na província de San Luis. Joel fazia parte do grupo de 61 brasileiros condenados por participarem do 8 de Janeiro e que estavam foragidos na Argentina.
Condenação
No Brasil, foi condenado a 13 anos e seis meses de prisão pelos crimes de abolição violenta ao estado democrático de direito, golpe de estado, dano qualificado, deterioração do patrimônio tombado e associação criminosa armada.
Ele entrou na Argentina pela fronteira
Joel foi solto em 9 de agosto de 2023 e ficou com tornozeleira eletrônica até 14 de abril de 2024, quando resolveu tirar da perna e sair do Brasil.
Por que ele tirou a tornozeleira e fugiu para a Argentina, com o risco de ter sua situação judicial piorada? Míriam diz que esta foi uma das perguntas que ela fez ao advogado: o que a fuga influenciaria na pena? Ele lhe respondeu que não influencia em nada.
“Ele quebrou uma medida cautelar. Se ele deixasse em casa e devolvesse para a polícia não haveria nenhum dano. Não acrescenta nada na pena dele e ele teve a oportunidade de entrar na Argentina. Ele entrou de forma legal, passou pela fronteira com documentos. Se tivesse algum problema, o sistema da alfândega apontaria”, relata. “Joel entrou com pedido de refúgio junto ao Conare (Comissão Nacional para os Refugiados). Ele tem o DNI (Documento Nacional de Identidade) permanente, não cometeu crime na Argentina, o crime pelo qual ele foi condenado não existe na Argentina. Ele não deveria estar preso”, fala Míriam.
Advogados acreditam na liberdade provisória
O escritório de advocacia argentino que cuida do caso dele acredita que conseguirá a liberdade provisória de Joel, esperança compartilhada pela família. “Desde 8 de novembro ele já tinha em mãos o DNI (Documento Nacional de Identidade), que é o documento necessário para permanecer na Argentina e trabalhar”, diz Míriam, em entrevista para o portal Sul Agora.
“Para conseguir o documento, ele não pode ter cometido crime algum na Argentina; isso mostra que ele é um perseguido político”, completa.
Joel, que no Brasil era caminhoneiro, já estava trabalhando regularmente no país vizinho, atuando como taxista, quando foi preso. Na ocasião, ele estava indo atrás de um outro emprego, em El Volcán, onde tinha uma promessa de trabalho com veículo pesado.
Joel e Míriam, que é pedagoga numa creche, são casados há 20 anos e têm dois filhos, um rapaz de 19 anos e uma moça de 17.
Joel passou fome na prisão e ficou na solitária
Joel disse à esposa que passou fome nos dias que passou na delegacia e que ficou 63 dias numa solitária. Neste mês ele ficou alguns dias na Penitenciária de San Luis, até ser transferido para a de Ezeiza, na última sexta-feira (24).
Na atual penitenciária eles podem utilizar um telefone fixo para que o detento possa se comunicar com a família. Foi assim que ele conversou com a mulher nesta segunda.
“O processo não teve início em Tubarão, em 1ª instância, mas sim no STF. Todos os recursos foram para o mesmo ministro. Quando saiu a condenação em fevereiro do ano passado, o Joel já ficou sem esperança. E quando o primeiro recurso foi negado, em abril, ele tomou a decisão de ir embora, com tornozeleira e tudo”, descreve.
O escritório de advocacia de Joel entende se tratar de um crime multitudinário (cometidos por um grupo de pessoas em um tumulto) e que não existe nas leis da Argentina, e por isso está com um recurso em trâmite.
Míriam diz que no processo não há um vídeo, foto, impressão digital ou constatação de DNA de Joel dentro de algum órgão dos Três Poderes. “As fotos que constam no processo são uma selfie no portão do quartel de Brasília com dois caminhões do exército”, diz.
Ida foi organizada por grupo de WhatsApp
Saiu apenas um ônibus de Tubarão rumo a Brasília para o 8 de Janeiro, que Míriam tenha ficado sabendo. Era um ônibus de dois andares, para cerca de 60 pessoas. Quando chegaram a Brasília, o grupo se dispersou, então não é possível saber se todos participaram das manifestações e se alguns ficaram apenas no QG do Exército.
De Tubarão, além de Joel, apenas a empresária tubaronense Camila Mendonça Marques e Maria de Fátima Mendonça Jacinto Souza, a Fátima de Tubarão, foram condenadas a 17 anos de prisão.